Nos últimos meses, temos visto ressurgir a tendência à procriação tardia como tema de reportagens em revistas e jornais de grande circulação. Cabe a nós, ginecologistas e, principalmente, especialistas em medicina reprodutiva, estar atentos a tais matérias, para que a interpretação devida lhes seja dada junto às mulheres que atendemos no dia-a-dia. Infelizmente, dissemina-se hoje com descuido a idéia de que os avanços da medicina proporcionam a maternidade a qualquer tempo além das fronteiras naturais. Sabemos que essa é uma inverdade e temos o dever de prestar à sociedade esclarecimentos.
De acordo com o sugerido por um estudo publicado em 2012, metade das mulheres ficariam chocadas ao serem informadas sobre a queda da fertilidade entre os 35 e os 45 anos de idade. Dentre as entrevistadas, um terço acreditava na persistência de algum grau de fertilidade até a menopausa, por volta dos 50 anos, e que a gravidez aconteceria sem dificuldades aos 40 anos de idade.
Os dados traduzem dificuldades e preocupações diárias do infertileuta, que tem o dever ético de esclarecer às mulheres naquela faixa etária (ou com idade maior) que, embora se sintam jovens e saudáveis, e gozem de plena capacidade profissional, podem já ter sofrido efeitos negativos do tempo sobre a fertilidade.
A preocupante desinformação observada sustenta-se, provavelmente, por crenças equivocadas que vinculam a garantia da fertilidade a estilo de vida saudável, histórico familiar de fertilidade abundante e informações incorretas de amigos e da mídia, principalmente com relação às gestações de celebridades em idade avançada.
Estima-se que 75% das mulheres que iniciam as tentativas de engravidar aos 30 anos darão à luz um nascido vivo dentro de 12 meses, enquanto apenas 44% o farão quando o início das tentativas ocorre aos 40 anos de idade. Em grandes populações, enquanto a infertilidade esteve presente em cerca de 30% das mulheres casadas com 35 a 39 anos, chegou a 64% entre 40 a 44 anos.
Foi publicado recentemente na revista Human Reproduction (uma das mais importantes revistas científicas na área de medicina reprodutiva no mundo) um estudo interessante abordando de forma inovadora a influência da idade da mulher sobre o potencial reprodutivo. O trabalho intitulado Too old to have children? Lessons from natural fertility populations demonstrou queda progressiva do potencial reprodutivo com o avanço da idade, em padrão semelhante hoje ao que ocorria cerca de dois séculos atrás: queda lenta até um ponto entre os 35 e os 40 anos, depois do qual a queda é vertiginosa.
Sabe-se que tanto a quantidade quanto a qualidade de folículos e gametas femininos relacionam-se inversamente à idade e que uma parcela significativa das candidatas à maternidade tardia serão inférteis quando desejarem gestar. O declínio natural da fertilidade pode ser atribuído a numerosos eventos associados ao avanço da idade, como diminuição da qualidade dos óvulos, frequência e eficiência da ovulação, e da função sexual, aparecimento de doenças uterinas, tubárias ou ovarianas, endometriose, fatores genéticos, tabagismo ou infecções.
E é importante frisar: as técnicas de medicina reprodutiva (como a fertilização in vitro e a injeção intracitoplasmática de espermatozóides) não driblam a interferência negativa da idade feminina sobre a fertilidade. Dados da RedeLatino-americana de Reprodução Assistida pontuam claramente redução significativa das taxas de gravidez em FIV com óvulos próprios à medida que a idade da mulher avança: 41% na faixa etária de 25 a 29 anos; 37% de 30 a 34 anos; 30% de 35 a 39 anos e 15% com 40 ou mais anos.
Uma opção contemporânea é o congelamento dos óvulos em idade jovem, com vistas à procriação futura. Sem dúvida um avanço da medicina reprodutiva nos últimos anos. Chamo atenção para um detalhe muito importante: o congelamento não garante os filhos no futuro, já que ainda restará à mulher a etapa da fertilização in vitro, que lhe dará taxas de sucesso entre 40% e 50% nas melhores perspectivas. E cabe, ainda, lembrar que, há cerca de um ano, a medicina reprodutiva brasileira é regulamentada pela Resolução 2013/2013 do Conselho Federal de Medicina, que limita o uso de técnicas de reprodução assistida a mulheres com idade máxima de 50 anos.
O que recomendar, então? Às mulheres com idade entre 32 e 34 anos, considerada uma faixa etária de conforto, que não esperem muito para dar início à constituição da prole, principalmente se há desejo por mais de um filho. A faixa etária entre 35 e 40 anos é considerada decisiva para a fertilidade. Embora o pessimismo exagerado seja questionável e, por quê não, condenável, recomenda-se que iniciem as tentativas de engravidar o quanto antes ou que se busque orientação de um especialista, caso ainda não seja, individualmente, momento ideal para a procriação. Depois dos 40 anos, enfim, fica mais difícil realizar o sonho da maternidade biológica.
Texto escrito pelo especialista Bruno Ramalho, com excelente visão e alerta sobre os perigos da idade para a fertilidade humana, sobretudo para a fertilidade feminina.